
Na sua 6ª edição, denominada “Terra ku no djunta”, o Café Jornalístico reuniu vozes da religião, jornalismo e sociedade civil para defender a convivência pacífica e combater a instrumentalização política da fé.
“Terra ku no djunta” teve como tema central a convivência inter-religiosa e o papel da comunicação na preservação da coesão social, num contexto político e social sensível. A mesa redonda reuniu figuras de destaque nas áreas da jurisprudência, ciências sociais, jornalismo e ativismo, além de representantes religiosos muçulmanos, cristãos e de tradições africanas, bem como influenciadores e membros dos Grupos de Kumpuduris di Paz, praticantes das diversas religiões.

Religião e política: uma RELAÇÃO DE tensão
Os e as oradores destacaram que a Guiné-Bissau, embora sendo um Estado oficialmente laico, enfrenta crescentes desafios relacionados à instrumentalização da religião em disputas políticas. Casos em que líderes religiosos ou grupos de fiéis são mobilizados em função de interesses partidários têm vindo a multiplicar-se, enfraquecendo os princípios de neutralidade religiosa e pluralismo democrático.
O país, ainda que pequeno em território, possui uma notável diversidade religiosa: diferentes confissões do islão e do cristianismo coexistem com práticas tradicionais africanas num cenário marcado pela convivência pacífica. Contudo, segundo vários intervenientes, essa harmonia tem sido colocada em risco por discursos de exclusão, insinuações de superioridade religiosa e tentativas de vincular fidelidade política à pertença religiosa.

Comunicação e desinformação: o papel das rádios e redes sociais
Num dos segmentos mais intensos do encontro, profissionais da comunicação refletiram sobre o papel dos media – formais e digitais – na prevenção de conflitos e na desconstrução de discursos de ódio. As redes sociais foram apontadas como espaços ambíguos, capazes tanto de amplificar vozes construtivas quanto de disseminar rumores, fake news e narrativas incendiárias. Foi destacado que os profissionais da comunicação devem resistir à pressão dos grupos de poder e recusar fazer eco de manipulações ou instrumentalizações religiosas. Jornalistas veteranos e jovens influenciadores digitais partilharam experiências de como o trabalho ético, verificado e transparente pode fazer a diferença, sobretudo em momentos de tensão política ou social.
A mesa redonda defendeu ainda a necessidade de uma regulação equilibrada e independente dos media, que proteja a liberdade de expressão, garanta diversidade de vozes e sancione práticas que atentem contra a dignidade humana ou fomentem o sectarismo. O Estado laico tem, neste domínio, a responsabilidade de proteger a integridade, o profissionalismo e a imparcialidade dos meios de comunicação.

Religião, valores e construção de paz
Para além das críticas e alertas, o encontro foi também um espaço de afirmação de experiências positivas. Representantes das diferentes tradições religiosas partilharam exemplos de colaboração inter-religiosa, campanhas conjuntas de sensibilização e solidariedade comunitária. A ideia de que a religião pode e deve ser um fator de reconciliação, compaixão e coesão social foi reafirmada.
Várias intervenções sublinharam que a fé, quando bem orientada, oferece referências morais e espirituais que contribuem para o respeito mútuo, a partilha e o cuidado com o outro. No entanto, também foi dito com clareza que a espiritualidade deve andar lado a lado com a racionalidade e com os princípios da justiça e dos direitos humanos.
A integridade dos líderes religiosos foi amplamente discutida, com ênfase na necessidade de proteger esses líderes contra instrumentalizações políticas e garantir a sua liberdade para atuar como agentes morais e de mediação, sem submissão a interesses externos ou sectários.

Responsabilidade partilhada e compromisso coletivo
No final do encontro, foi lançada uma chamada à ação dirigida a todas as pessoas presentes e às audiências que acompanharam a transmissão: líderes religiosos e praticantes, jornalistas e radialistas, formadores de opinião e cidadãos conscientes. O apelo é claro: que cada um assuma a sua parte na construção de uma sociedade mais justa, informada, plural e solidária.
Foi dito com firmeza que o extremismo religioso não encontrou até agora espaço na Guiné-Bissau – mas que essa resistência depende da vigilância ativa e da promoção de valores comuns. Num contexto regional marcado pelo avanço de grupos extremistas em países vizinhos, a Guiné-Bissau deve preservar o seu capital de convivência, investindo em educação cívica, diálogo constante e responsabilização institucional.
O Café Jornalístico “Terra ku no djunta” continua assim a afirmar-se como um espaço estratégico de formação crítica e engajamento cidadão, onde as fronteiras entre fé, jornalismo e política podem ser debatidas com profundidade, respeito e responsabilidade.

No dia 19 de junho de 2025, realizou-se no espaço Djemberem Boal & Freire do CTO-Bissau / Fórum de Paz a 6ª edição do Café Jornalístico “Terra ku no djunta”, uma iniciativa que se consolidou como espaço regular de debate público entre jornalistas, líderes sociais e convidados da sociedade civil guineense.
Promovido pela SINJOTECS em parceria com a Comissão de Jornalistas e a Comissão Religiosa do Fórum de Paz, o encontro contou ainda com a colaboração das rádios comunitárias do interior da Guiné-Bissau e das Radios parceiras da capital – Rádio Jovem, Rádio Bombolom, Capital FM, Rádio Sol Mansi – e a transmissão direta pelas plataformas da Rádio Bemba di Malafo FM 100.4 MHz, soundcloud, Facebook, TikTok e posterior publicação no YouTube @CTO-Bissau_FórumdePaz.